Três Meses
Sean
Quinta-feira à noite e eu já sentia meu coração acelerado. Ansiedade me impedia de dormir. Eu veria Beatrice no dia seguinte, em algum horário noturno quando conseguisse chegar a Washington. Outra vez. Isso estava ficando ridículo e necessário. Eu me debatia entre dois sentimentos. Incapaz de me decidir, sem jamais ter sentido nada parecido. Havia acabado de descobrir um novo medo, não sabia se podia seguir nesse caminho.
Era novo e inesperado. E já conseguia ver para onde estava indo. Completaria 3 meses nesse sábado. Semana que vem eu não ia vê-la, tinha uma viagem em meu caminho. E já sentia a decepção só de pensar nisso, antes mesmo de encontrá-la. Ao mesmo tempo que sabia como terminaria, não tinha noção de para onde iria. Eu nem poderia ter começado isso.
Momento ruim.
Vida errada.
Eu estava desgraçado desde o dia que abri aquele envelope que ela me mandou.
Não.
Foi desde a noite que olhei dentro daqueles olhos dourados. Eu só não sabia disso naquele momento. Não me dou com sentimentos arrebatadores, não acredito nisso. Então eu entrei e o tempo passou. E eu acabei assim, no terraço do meu apartamento, às 2:20h da manhã. Estarei no trabalho às 8:30h. Porque às 9h terei uma conferência. Se não a atender, não adianta nada ter deixado de viajar para Zurique só para poder vê-la.
Nunca pulei tantas cidades. Hoje é Zurique, semana retrasada foi Paris, outro dia foi Bruxelas, o resto eu esqueci. Pois estava ocupado demais pensando em chegar a Baltimore ou a Washington. Duas cidades que não pulo mais. Tudo porque agora eu vou onde Beatrice estiver.
3 meses tentando não ir mais fundo.
Mas vou continuar com isso. E não vou conseguir parar antes que seja tarde demais. Vou cometer alguma loucura. Ultrapassar limites para mantê-la. E pensarei: Só mais um pouco. Como um sonho do qual não quero acordar. Pois desde que ela passou a existir para mim, passei a pular cidades e pesadelos. Se eu não for para muito longe dela, eles não podem mais me pegar. Acho que é o único pensamento infantil que me sobrou. Se ficar perto dela, se não fizer nada errado, os monstros só passam por mim e eu não a perco.
Vou acabar devastado. Todo quebrado, coberto de sangue e preso no escuro outra vez. É como vou me sentir. Esse é o fim que eu sei que está lá. Quando meu tempo vai acabar? O que vou precisar para ver isso? Até onde eu vou ser capaz de chegar?
3 meses já é tempo demais para mim.
Ela sequer veio até aqui, eu não pedi, ela nunca tocou no assunto. Mas quando ela chegar, não terá mais volta. E eu sei que vou olhar para ela amanhã e vou pedir, em breve, em poucos dias. No próximo final de semana, quando embarcar para Seoul e estiver mais longe dela do que já estive desde que isso começou, vou lhe pedir.
Venha me ver. No lugar onde eu moro. Onde me sinto seguro.
Essas paredes nunca serão as mesmas depois que ela estiver aqui dentro. Eu não sou o mesmo, então que chance concreto e vidros teriam? Eles não são mutáveis como uma pessoa.
Mas ela ainda não me quer assim. Vai seguindo a corrente, com aqueles olhos lindos me observando, sorrindo para mim, rindo de mim e me colocando na corda bamba. Não sou estável o bastante para ela. No seu livro, 3 meses não é tanto assim. Ainda não valho um coração quebrado. Ela me faz sentir nessa mesma corda. Vai me chutar de lá a qualquer momento, antes que eu a alcance.
3 meses de incertezas.
Tão pouco tempo e nada mais é suficiente. Não é só estar em sua presença. Sua voz me acalma, mas não é tudo que preciso. Não é apenas seu corpo, seu gosto, seu cheiro e o sexo que compartilhamos. O pico viciante da sua entrega que se intensifica a cada vez que ficamos juntos. Posso tocar seu cabelo, apertá-la junto a mim, me impregnar nela, fingir que ela leva um pedaço meu a cada vez que vou embora. Mas nada, nada é suficiente. Onde eu encontrarei um limite? Quando essa ânsia acaba?
Meu corpo não é capaz de corresponder ao desejo que sinto por ela. Não importa que esteja saciado, que tenha acabado de estar dentro dela. É profundo como respirar e é apavorante sentir isso. Quero que pare, quero sair.
Então aquela semana se passou. Eu ia para longe.
Vou lhe pedir. Vou lhe comprar uma passagem de avião.
Quanto mais longe eu vou, mais os meus pensamentos mudam.
Espere por mim.
Meus pensamentos deixaram de ser sobre chão frio, água gelada…
Agora eu só penso que em 12 dias, Beatrice vai descobrir que nada disso vale a pena. E é patético, não é uma conta que eu saiba fechar.
Num mundo ideal, não importa quanto tempo passe, nada muda. Mas eu só vi este mundo em livros.
Não vou viver nele. Não vou fazê-la viver assim.
Aos 6 meses, estarei aterrorizado, com medo de oprimi-la. De sufocar ou sufocá-la.
Aos 10 meses, terei feito tudo que jamais imaginei.
Em 1 ano com ela, nada poderá me curar. Minha cabeça é um mar de estatísticas, é o meu trabalho. Ao completar 1 ano, o amor do qual desconfio agora, terá se transformado em algo que nunca vi. Pode ser belo, pode ser a antítese de um monstro, mas é tão dominador quanto.
É ótimo saber que vou estragar tudo muito antes, não vou?
Vou machucá-la, magoá-la, vou levar o que ela sente por mim a um extremo tão inesperado que o sentimento ficará feio. Vou deixá-la obsessiva como eu, vou mexer com sua mente, estragar todos os planos que ela já fez na vida sobre ficar com alguém. Vou quebrá-la, porque no ritmo que estou evoluindo nisso, jamais será ruim só para mim.
Tudo porque resolvi me apaixonar pela pessoa mais especial que apareceu na minha vida. A única que torna minha existência suportável. Ela me faz feliz. E eu não posso ter nada bom sem esmagar. Vou segurar com força demais e terei que soltar para não destruir.
3 meses.
1 semana.
Quando ela vai aceitar vir aqui?
Seis meses
Bea
Ele me comprou uma passagem de avião para Nova York. Foi assim que entrei num caminho sem volta. Foi onde sucumbi. Afundei de vez naquele caminho perigoso de sentimentos. Eu deixei e assim me permiti entrar no mundo dele. Enquanto eu que o fazia gastar horas em voos para onde eu estava, era como se o controle fosse mais meu do que dele.
Era uma ilusão, mas era confortável.
Porém, no meio do terceiro mês, eu disse que sim, eu iria. Ele queria, eu senti antes de acontecer. Estive ocupada, muito ocupada. O que era ridículo de dizer, comparado ao nível de estresse e ocupação que ele tinha. Seu pedido soou mais como uma demanda, não só porque ele queria muito, ele precisava. Ele não disse, mas era a minha vez. Eu podia jurar que a voz dele soava cansada, mesmo que fosse só imaginação minha. Havia chegado a um ponto em que eu já podia fazer afirmações sobre ele, baseado no jeito como parecia, no tom que usava e… em como sua voz soava. Não podia ver seus olhos pelo telefone, pois desde o início eles me davam certeza de muita coisa.
Você pode vir aqui? É onde eu moro…
Eu não tinha certeza. Ir lá ia me comprometer.
E Sean me fazia ter receio. Ele me arrebatava tanto quanto me afastava.
Mesmo assim, eu disse: Acho que posso.
Achar não era suficiente para ele. Então ele arrancava a certeza. Sexta-feira à noite. Sim, eu disse sim. Quando entrei no avião, era como se tivesse perdido a cabeça para uma aventura. Porém, quando eu entrei no apartamento dele, uma metáfora para finalmente aceitar entrar em sua vida e não ficar só olhando da porta. Aí sim eu senti como se nunca mais fosse voltar.
E apesar de ter acontecido meses depois de tê-lo conhecido, foi quando o mundo de Sean Ward se tornou o meu mundo.
Eu nunca mais ia conseguir sair. Eu sequer ia querer, o que era pior.
Só que 3 meses depois, eu fugi.
Foi como ver uma porta que eu não tinha enxergado antes. Nós só nos víamos nos finais de semana. E não era em todos. Quando nos reencontrávamos, era sempre desesperador. Depois do momento inicial, agíamos como se estivesse tudo bem.
Tudo mentira.
Queríamos consumir um ao outro para voltar a se sentir vivo. Era intenso, não sabia que podia ser assim. O jeito como eu tinha que lhe dar o meu corpo não podia ser o normal das pessoas por aí, podia? Ninguém consumia o outro dessa forma. Mas ele fazia comigo.
E aí pensávamos: foram só alguns dias. Mas não foi só isso. Nunca era.
E ele viajou e ficou 12 dias longe de mim. Quando 1 semana passou, foi como levantar a cabeça acima das nuvens e quando mais dias passaram, eu me perguntava porque o céu tinha aberto. Minha vida continuou nesse meio tempo. Toda vez que nos falávamos, eu sentia que ele não estava contente. Não havia satisfação.
Nós estávamos à beira de uma discussão o tempo todo. E não sei por que, ele não embarcava, dava para ouvir em sua voz que ele estava hesitando. Eu estava insegura. O que exatamente ele esteve fazendo? Para onde foi? Por que parecia que queria me controlar quando eu tinha zero controle sobre ele? Sim, parecia. Como simplesmente não me dizia, eu só imaginava.
Porque quando ele resolvia dizer, a força das palavras era como um soco. Talvez eu que não estivesse acostumada a receber a verdade de um jeito tão cru. Ele podia amaciá-la, tratá-la bem e me entregar. Mas não, Sean era todo feito de bordas duras e cortantes. Suave quando me tocava, arrasador quando precisava.
Não estávamos dando certo. Às vezes eu pensava que era minha inexperiência, muita cautela para não ser tão ingênua quanto era. Nunca estive em um relacionamento sério. Mas ele também não. Ele pedia desculpas, não sabia como fazer, como me manter, mas ele me queria. E soava como se eu não o quisesse.
A verdade, era que o que sentíamos um pelo outro me assustava.
Eu achava que sabia muita coisa, era adulta, tinha ido embora, tomava conta da minha vida. Eu tinha 22 anos, era uma idiota. Muito apaixonada.
Por que eu sinto que para você tudo bem se ficar longe por 1, 3 ou 4 semanas? Não faz diferença — disse ele, ligando sabe-se Deus de onde. Eu não reconhecia todos os códigos de países.
Você que se afasta, eu só o vejo indo e indo.
E às vezes eu também me cansava. A culpa não era minha! Ele precisava fazer o que fazia, mas eu não.
Nós chegamos ao ponto de quebra e a briga que gerou minha fuga foi só a consequência:
Você não se compromete.
Você quase não existe.
Você é imatura.
Você é um babaca.
Quem é esse cara?
Agora vai ser ciumento também?
Você me usa como mais uma aventura.
Todo mundo acha que eu sou só a sua nova puta.
Você não me escuta. Você não me enxerga.
Foi a primeira vez que explodiu de verdade. Nós saímos dando golpes com cada frase. Ele me acertava, mas eu devolvia para derrubar. Porque se jogasse baixo, eu jamais me revoltaria o suficiente para sair por aquela porta.
Fui embora. Fugi dele e do que sentia.
Um passo para fora do prédio dele e eu queria morrer. As lágrimas vieram e eu nem tinha conseguido chegar ao aeroporto. Nunca devia ter ido lá. Pois depois que ele pediu e eu aceitei, onde ele estivesse, eu aceitaria ir. Não me importava mais em fazê-lo vir ao meu mundo. Eu iria.
Sean não me quer. Ele precisa. Ele necessita. Ele diz que sou a sua ruína. Se ele escondesse, seria mais fácil. Ou não… Pois não sei o que farei se algum dia ele passar a se esconder de mim.
Ele não me oprime, não abusa, não me limita. Jamais me aniquila… Mas ele me esmaga. Embaixo da força da sua presença, na intensidade do seu olhar, da entrega do seu toque. E do encanto das suas palavras.
E depois de 6 meses, ele me escravizou sob o poder dos seus sentimentos. Eles se tornaram reais, ele os dizia, derramava-os sobre mim. Fortes demais, podiam me comprimir. Era assim que me dominava.
Eu não sei viver dominada, nunca vivi assim, não me imaginei vivendo. E, no entanto, minha dor por ter acabado era muito mais forte do que tudo. Só me lavava com lágrimas, porque então eu notei que nesses 6 meses eu me tornei igual a ele. O que ele derramava sobre mim, eu o cobria de volta. Eu o prendia sob a força do meu amor. Era assim que eu vivia livre dentro da vida dele. E ele da minha.
Então eu peguei outro avião para Nova York. Eu paguei essa passagem, não disse nada a ninguém, foi uma decisão só minha. Consciente.
Voltei ao mundo dele.
Nunca mais vou conseguir sair.
Eu sei.
Porque eu não quero sair.
Esse texto nunca foi revisado (acabei de reler e ajeitar para vocês!). Ele é parte dos extras do primeiro casal. Pode sofrer alterações antes de ir para a versão final.
Esse pedaço se passa dentro do livro: Quando Eu Te Encontrar.